Voltar ao site

COLUNA DA ELÔ LEBOURG: Relações amorosas entre professores e alunos

Texto 90

Tenho construído minha prática como professora a partir de uma proposta que humaniza minha relação com os estudantes. O combinado é que a gente se trate sempre bem, com delicadeza e respeito. Procuro, além disso, optar por aulas em que todos se sintam à vontade e seguros para serem quem são e para construírem seu conhecimento sobre o que estamos estudando à sua maneira.

Mesmo assim, os desafios são constantes. E, quando sou professora de estudantes jovens ou adultos, um desses desafios é aprender a lidar com os pontuais casos em que alguns deles se apaixonam por mim.

Tenho muita reserva com professores e professoras que se relacionam amorosamente com seus alunos. Reconheço que uma relação entre docentes e discentes é uma relação de poder. Há uma hierarquia, independentemente da forma como se praticam as relações de ensino e aprendizagem. O professor pode ter uma conduta amigável, mas ele avalia, atribui notas, chama a atenção, corrige, propõe mudanças. É dele a decisão sobre conceder uma “segunda chance” ou não. É ele que, muitas vezes, mostra o caminho que os estudantes deverão percorrer, e que define as principais regras das disciplinas que ministra.

Assim, sempre defendi que esse limite, o das relações amorosas, não deveria ser ultrapassado por um professor, ainda que o estudante fosse um sujeito já adulto. Há muitas questões que precisam ser pensadas a esse respeito. Creio que, se um professor se envolve amorosamente com uma pessoa que é sua aluna, essa relação não deixa de acontecer na sala de aula. Assim, a confusão entre a amorosidade e a disciplina estudada pode afetar a forma como o estudante aprende e, em certa medida, afetará toda a turma. Se, por algum motivo, a relação se interrompe no meio do processo, esse é outro complicador. Se se trata de um relacionamento abusivo ou problemático, pior ainda.

Mas há outra questão importante: como lidar com o estudante que está apaixonado pela gente, especialmente aquele que se declara?

Nunca, em minha formação, este assunto foi devidamente abordado e ainda tenho aprendido sobre ele, mas tenho tentado, quando isso me acontece, deixar claro que a minha relação com a pessoa não vai extrapolar esse lugar estabelecido inicialmente, que seguirei sendo a professora e o outro, meu aluno ou minha aluna. Mostro, num diálogo o mais claro e suave possível, que faz parte da minha conduta ética e política de professora não me envolver amorosamente com meus alunos, que isso é justamente um cuidado com todos os estudantes com os quais me relaciono.

Mas o que se passa do “outro lado”, do ponto de vista do aluno? Nem sempre os estudantes que recebem meu “não” compreendem meus motivos. Às vezes, noto que isso repercute na forma como lidam comigo em sala de aula ou mesmo em sua disposição para aprender o conhecimento que estou tentando construir junto. Faz parte, creio. A profissão docente traz consigo a necessidade de aprendermos a lidar com o outro, com suas histórias e com seus desejos. Às vezes, viramos “alvo” desses desejos. A forma como reagimos a essas situações, estabelecendo limites e trazendo de volta a relação de ensino e aprendizagem para um primeiro plano, diz muito do nosso próprio entendimento sobre como encaramos nossa profissão e nossa prática.

(Eu sou a Elô Lebourg, idealizadora da rede Professores transformadores. Entre tantas coisas, sou graduada em História e mestra em Educação. Sou uma professora transformadora também, dessas que acredita que vai mesmo melhorar o mundo.)