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COLUNA DA GISELLI AVÍNCULA: A arte de narrar histórias. Posso eu?

Texto 6

Entonces ustedes ya saben que cuando vayan a una comunidad de montaña alta sobre todo en Perú, en Bolivia, o en Ecuador también, si ustedes ven que la gente está tomando y dicen: ¡A la Pacha Mama! Y le da un poquito es porque la Madre Tierra, también sobre todo, tiene que beber... Eis um trecho da contação de histórias da atriz, narradora oral e gestora cultural, a peruana Rosana Reátegui que, no segundo semestre de 2017, na sala de leitura de uma das escolas em que trabalho, apresentou a sessão lúdica De la montaña al mar? Contos banhados pelo Rio Amazonas. A narrativa foi realizada em língua espanhola de forma a fortalecer a premissa básica da escola que oferece educação bilíngue português-espanhol. Foi a minha primeira ação, enquanto agente de leitura, de difundir a narrativa da oralidade, uma arte ancestral e uma das primeiras experiências estéticas do ser humano.

Neste ano, numa outra escola em que trabalho, em homenagem ao Dia Nacional do Livro Infantil (18 de abril), a agente de leitura que lá trabalha e eu programamos uma roda de contação de histórias para os alunos do curso de formação de professores/curso normal. Apresentamos, às estudantes, algumas técnicas e recursos – o livro artesanal, o avental de estórias, teatro de fantoches, dedoches – para que fosse estimulado, no exercício do Magistério, o apreço pela leitura e a formação de novos leitores desde a Educação Infantil.

Minha companheira de trabalho, que foi a facilitadora, é contadora de histórias com formação técnica e acadêmica. Assim, julgamos que seria uma ótima oportunidade de aproveitar a experiência profissional dela para oferecer uma breve capacitação para a utilização da literatura infantil às estudantes do curso normal. Ainda naquele dia, no turno da noite, pensei em realizar alguma atividade de homenagem ao Dia do Livro Infantil para os alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Confesso que pestanejei em fazer, tanto por não ser especialista em literatura e na arte de narrar histórias (sou professora de Sociologia), quanto por temer ser julgada, pelos próprios alunos, de infantilizá-los. Enquanto articulei profissionais da área para a proposta de contação de histórias, sentia-me numa situação profissionalmente responsável por priorizar a técnica. Ainda assim, prossegui com o desafio. Por que não?

Convidei a professora de Língua Portuguesa para levar, à biblioteca, a turma do módulo III da EJA, que possui estudantes da faixa etária de 24 a 55 anos. Iniciei elucidando a origem do Dia Nacional do Livro Infantil, dia do nascimento de Monteiro Lobato, uma homenagem ao escritor brasileiro que deu protagonismo às crianças na sua obra. Realizei as seguintes atividades: contação coletiva através de um livro sem texto, Telefone sem fio, de Renato Maricone e Ilan Brenman, pedi aos alunos para contar a história clássica da Chapeuzinho Vermelho com avental de histórias e bonecos de feltro, e, por fim, utilizei a reeleitura desse conto com a obra Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque. Nas três histórias havia os personagens da Chapeuzinho e do Lobo Mau.

Na maior parte da atividade, os alunos tiveram dificuldade de interagir com os livros e de visualizar a literatura como um recurso de leitura do mundo. As conversas paralelas e o tom de brincadeira imperavam durante toda a proposta. Apenas quando finalizei e propus a reflexão do último livro que versava sobre a superação do medo, de como a personagem Chapeuzinho Amarelo, ao estar frente a frente com objeto de seu medo – o lobo –, percebeu, que, de perto, ele não era tão atemorizante assim, pude visualizar a atenção e o silêncio dos alunos atentos ao que eu traduzia sobre “a moral da história”.

Nesses últimos dois anos, na função de agente de leitura, venho aprendendo novos saberes pedagógicos atrelados ao processo letramento, e desconstruindo paradigmas de que bons professores são os que enfocam nos saberes disciplinares da formação de origem. Essa experiência de contação de histórias ratificou a importância do professor em facilitar a aprendizagem e conduzir reflexões encadeadas que nem sempre estão claras para nossos alunos, seja de qualquer faixa etária. Percebi, juntamente com os estudantes, nesta atividade, a necessidade de mergulharmos nas diversas literaturas para resgatar a criatividade e o universo da fantasia tão presente no mundo infantil e que, muitas vezes, são esquecidos e adormecidos nos adultos devido às demandas da vida prática.

(Sou a Giselli Avíncula, professora de Sociologia, mestra em Ciências Sociais e bacharelanda em Terapia Ocupacional. Hoje, atuo como agente de leitura. Alimento a teimosia da minha alma educadora, acredito na inteligência emocional e na potencialidade dos fazeres humanos para sensibilizar o potencial por conhecer.)