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COLUNA DA MICHELLE RISTOW: A composição do que vivemos

Texto 3

Terminamos as reuniões de pais há duas semanas. Gosto de refletir sobre cada encontro que tenho com os pais e avalio com carinho suas perguntas, dúvidas e receios. Relembro as alegrias, os sorrisos e até mesmo as angústias que alguns pais trazem.

As crianças que caminham comigo no percurso de aprendizado têm entre 8 e 10 anos. São sedentas por conhecimentos, saberes e atravessam as experiências com uma força ativa. E que fique bem claro: as crianças são curiosas desde sempre.

Entre o que eu vejo e noto em cada período que passamos juntos, percebo uma linha tênue que, às vezes, se não cuidada, separa pais e filhos.

Toda reunião, para mim, é motivo de falar da essência, ou seja, de quem eles são. Do que brota em cada encontro. Do que emerge daquilo que já possuem dentro de si. Vai muito além de apresentar notas e mostrar “resultados”.

Temos uma concepção na Wish School, escola em que atuo, que é exatamente a de falarmos sobre a constituição da essência de cada criança, esse ser humano incrível que brota, que emana e grita criatividade, sabedoria e inteligência.

Falamos dos processos de libertação pelos quais passam, ainda pequenos, justamente por oferecermos autonomia e uma consciência de autorresponsabilidade que, até então, nunca tiveram. E é belo quando eles descobrem que possuem a capacidade de se observar, de compreender seu contexto, de entender seu momento e decidir.

Aprendemos juntos a construir um percurso que valida quem é cada criança e, quando reapresentamos os filhos aos pais, algumas vezes, chegam as lágrimas.

Lágrimas de Você tem certeza que está falando da minha filha? e Vocês estão falando de outra criança. De Realmente, minha filha é incrível! ou Ele é exatamente isso! Seja qual for o motivo – espanto, surpresa ou identificação –, enxugamos as lágrimas juntos ou, simplesmente, rolam do lado de lá e de cá também.

O processo de desconstrução que nós, pais e educadores da Wish, passamos, é bonito e doído.

Bonito, porque acreditamos que nosso olhar para a criança não deve estar ligado ao julgamento, a comparações e críticas, assim, a temos como única no processo. Reconhecemos quem ela é em sua inteireza. Doído, porque muitos de nós viemos de uma educação e de uma criação angustiantes, que julga, compara e critica, portanto, se crescemos assim, temos um cuidado enorme de nos desfazermos daquilo que fizeram conosco e transformar nossa visão, justamente para não fazermos o mesmo.

Acredite, é um trabalho árduo e difícil, mas com uma capacidade incrível de nos tirar de mais uma bolha de crenças negativas a respeito do ser humano. Todos os dias é uma ressignificação. Sinto que, em cada reunião com os pais, existe uma linha invisível, mas, mesmo invisível, eu imagino que ela seja muito colorida, costurando esse encontro e promovendo sutilezas de desacelerar num mundo que ainda exige que tudo seja para ontem e que tem exigido isso das crianças também.

Por isso, defendo o diálogo reflexivo com os pais e a mudança de pensamento que precisamos passar em virtude das estruturas arcaicas tão sólidas e enraizadas em nós e que são tão difíceis de se quebrar, reconhecendo abraços quentes às nossas dores de adultos e nos acolhendo como uma rede de apoio para aliviarmos e deixarmos as crianças viverem no seu tempo e em paz.

(Eu sou a Michelle Ristow. Transformadora de mim mesma. Uma sonhadora consciente da realidade e esperançosa por natureza. Acredito na relação que oferece espaço, promove autonomia e considera o lugar de fala do outro. Gosto de aprender brincando, ouvindo histórias e conversando.)